Desconectada de Mim: Quando o Corpo Não Parece Meu
A estranha sensação de me enxergar em terceira pessoa, viver como espectadora da minha própria vida e não me reconhecer no reflexo.
Quando Olhar no Espelho Não é o Suficiente
Há dias em que me olho no espelho e, por mais que o reflexo diante de mim seja claramente o meu corpo, sinto como se estivesse observando alguém desconhecida. A visão é nítida, mas o que vejo não parece ser meu. As linhas do meu rosto, o movimento das minhas mãos, até os passos que dou parecem ser de outra pessoa. Eu sei, racionalmente, que tudo aquilo é meu – que aquele corpo é meu, que as ações que tomo são minhas. Mas, em momentos como esses, não há essa conexão óbvia entre eu e meu próprio corpo. Parece que as decisões não estão vindo de mim, como se eu fosse apenas uma espectadora da minha própria existência.
Essa sensação de distanciamento é profunda. Fico ali, parada, observando minhas reações, minhas expressões, como se estivesse em um cenário que não me pertence completamente. O mais estranho é que a visão não me causa desconforto físico – mas, sim, uma desconexão emocional. Como posso estar tão próxima de mim mesma, mas, ao mesmo tempo, sentir que não estou no controle do meu próprio ser? Como posso me ver e, ao mesmo tempo, não sentir que sou eu de fato, mas apenas alguém que está encarnando a minha vida?
É como se o espelho, por mais que revele minha imagem externa, não fosse capaz de mostrar quem eu realmente sou por dentro. Ele reflete o que está visível, mas não consegue captar os sentimentos, as emoções, as escolhas que fazem de mim quem sou. Sinto-me como uma atriz que, de repente, se perdeu no papel e agora não sabe mais onde termina o personagem e começa a realidade.
Essa sensação de estar em um palco sem saber qual é o meu verdadeiro papel é desconcertante. Eu vivo minha rotina, tomo minhas decisões, falo, me movimento, mas, por dentro, é como se estivesse apenas observando uma vida que não consigo reconhecer plenamente como minha. Em um segundo, estou ali, fazendo algo rotineiro, e no próximo, me sinto distante de mim mesma, como se estivesse observando tudo de uma janela distante. A sensação de estar fora de mim mesma, como se meu corpo fosse apenas uma cápsula onde minha mente se perdeu, é inquietante e, muitas vezes, difícil de compreender.
Em dias assim, a estranheza de viver essa separação entre corpo e mente se intensifica. Sinto-me flutuando entre dois mundos – o físico, onde todos me veem e interagem comigo, e o interior, onde sou uma observadora passiva, como uma espectadora em um filme que se passa diante de mim, sem poder interagir com ele. Não há uma identificação clara entre o que vejo e o que sinto. E isso cria um vazio, uma distância, que não sei como preencher.
O paradoxo dessa sensação é que, ao mesmo tempo em que sei que sou eu, não me reconheço totalmente. Olhar no espelho não é mais o suficiente para sentir que estou viva de verdade. Eu me vejo, mas o reflexo não carrega a totalidade de quem sou – ele apenas mostra o que está diante dele, enquanto minha alma parece estar em outro lugar, olhando a cena de longe.
Essa desconexão é, para mim, uma experiência dolorosa, mas também uma oportunidade de reflexão profunda. Por que, em alguns momentos, sinto que sou uma mera espectadora da minha própria vida? O que está acontecendo dentro de mim que me impede de me conectar com o meu corpo e as minhas escolhas de forma plena? Talvez, ao tentar entender essa sensação, eu possa encontrar uma forma de reintegrar esses dois mundos, de me olhar e me sentir, finalmente, inteira.
Psicologia da Despersonalização: O Que Está Acontecendo Comigo?
Quando passamos a viver a sensação de estar fora de nós mesmos, de observar o próprio corpo como se ele fosse de outra pessoa, podemos estar enfrentando um fenômeno psicológico conhecido como despersonalização. Esse distúrbio, que muitas vezes se manifesta de forma temporária, traz consigo uma desconexão entre o indivíduo e sua própria identidade, uma sensação de estar dissociado da realidade interna e externa. Mas o que está acontecendo com o nosso cérebro quando isso ocorre? E por que essa sensação é tão assustadora, ao ponto de nos fazer questionar nossa própria existência?
A despersonalização, na sua essência, é a experiência de se sentir estranho, alheio ao próprio corpo e à própria mente. Ela pode ocorrer de diversas formas: às vezes, sentimos que estamos assistindo à nossa vida de fora, como se fôssemos um observador passivo. Em outros momentos, podemos até ver nosso próprio corpo, mas não conseguimos nos identificar com ele – como se ele fosse apenas uma casca, sem conexão com quem realmente somos por dentro. Essa sensação pode ser desconcertante e até angustiante, especialmente quando não conseguimos compreender sua origem ou como lidar com ela.
Mas a questão é: o que realmente acontece no cérebro quando vivenciamos a despersonalização?
A ciência nos oferece algumas respostas interessantes. De acordo com estudos sobre o fenômeno da despersonalização, o cérebro humano tem áreas específicas responsáveis pela percepção de identidade e pela sensação de “estar no próprio corpo.” Essas áreas são especialmente ligadas ao sistema nervoso central e ao processamento das informações sensoriais. Quando essas áreas são ativadas de maneira inadequada, seja por questões emocionais, traumas ou disfunções neurológicas, o cérebro pode gerar a sensação de que estamos fora de nós mesmos, desconectados do corpo e da experiência emocional.
A relação entre o cérebro e a despersonalização é complexa. Em termos simples, quando estamos em uma situação de estresse extremo ou trauma, a parte do cérebro responsável pela percepção de identidade e pelo controle do corpo pode entrar em um estado de “desajuste”. A amígdala, que é crucial para o processamento das emoções, e a região parietal, que lida com a percepção do espaço e do próprio corpo, podem não se comunicar da forma como deveriam. Isso resulta na sensação de estar fora do próprio corpo ou de não ser capaz de se conectar com as emoções de maneira profunda e autêntica. O cérebro, em resposta a essa desordem, cria uma forma de defesa, uma tentativa de se proteger do sofrimento emocional ou físico.
Agora, podemos nos perguntar: qual a conexão entre despersonalização, ansiedade e trauma?
A resposta é que a despersonalização é muitas vezes um mecanismo de defesa, uma resposta inconsciente a experiências extremas ou traumáticas. Quando passamos por situações de grande estresse ou dor emocional, nossa mente pode buscar uma forma de lidar com a intensidade desses sentimentos – e, muitas vezes, a maneira de fazer isso é nos distanciando de nossas próprias emoções. A despersonalização surge como uma tentativa de escapar do sofrimento, permitindo que a pessoa se distancie do momento presente, como se não fosse possível lidar com a intensidade da experiência.
A ansiedade, especialmente a ansiedade crônica, também pode desencadear episódios de despersonalização. Quando estamos constantemente em estado de alerta, com a mente acelerada e o corpo sobrecarregado de tensão, isso pode interferir na maneira como o cérebro processa as informações. A despersonalização surge, então, como um efeito colateral dessa hipervigilância, uma maneira de o cérebro tentar lidar com a sobrecarga emocional, criando uma sensação de distanciamento como uma proteção.
Além disso, traumas não resolvidos, especialmente os traumas infantis ou experiências de abuso, podem contribuir para o desenvolvimento de distúrbios de despersonalização. Quando uma pessoa sofre um trauma profundo, o cérebro pode reverter para um estado dissociativo, no qual a percepção da própria identidade se fragmenta. Isso cria uma desconexão da realidade, pois o indivíduo não consegue mais processar de forma saudável as emoções e as sensações relacionadas ao trauma. Nesse contexto, a despersonalização atua como uma forma de sobrevivência psicológica, uma forma de escapar de uma realidade insuportável.
Portanto, a despersonalização não é apenas uma questão de “sentir-se estranho” ou de “não se reconhecer”. Ela está profundamente conectada com os processos emocionais e cerebrais que regem a nossa percepção de identidade e a forma como lidamos com as emoções e os traumas. Quando o cérebro se encontra sobrecarregado, seja por estresse, ansiedade ou trauma, ele pode gerar esses episódios de distanciamento como uma forma de se proteger da dor emocional. E isso nos leva a uma questão importante: como podemos lidar com isso?
O primeiro passo é entender que a despersonalização não é um reflexo de falha pessoal, mas sim um mecanismo natural de defesa que o cérebro utiliza quando se sente sobrecarregado. Buscar ajuda terapêutica, como psicoterapia ou técnicas de mindfulness, pode ser essencial para entender as raízes dessa sensação e aprender a reconectar-se com o corpo e com a identidade. A jornada de reconciliação com o eu pode ser longa e difícil, mas compreender o que está acontecendo no nível psicológico e neurobiológico é um passo fundamental para lidar com essa experiência de forma mais saudável e equilibrada.
A Dualidade Entre Quem Somos e Quem Vemos
O que significa ser alguém? Quem realmente somos: a imagem que vemos no espelho ou aquilo que sentimos internamente? Existe um momento na vida em que olhamos para nós mesmos e percebemos um abismo entre a nossa aparência e a essência que carregamos dentro de nós. O cérebro nos dá uma identidade, nos permite existir como indivíduos distintos, mas por que, às vezes, sentimos que há uma desconexão entre quem somos e quem vemos?
Essa dualidade entre o “eu” interno e a imagem externa tem fascinado filósofos, cientistas e psicólogos há séculos. Há momentos em que sentimos que somos mais do que apenas um corpo, como se existisse algo além da matéria, algo que não pode ser reduzido à biologia. No entanto, nosso cérebro é a estrutura responsável por criar essa identidade, moldando a forma como nos reconhecemos e interagimos com o mundo. Mas como ele faz isso?
O Cérebro e a Construção da Identidade
A identidade humana é construída a partir de múltiplos processos cerebrais que envolvem memória, percepção e emoção. Nosso cérebro tem regiões especializadas para nos fazer sentir “nós mesmos”, permitindo que reconheçamos nossos rostos, nossa voz e nossos pensamentos como parte de um único ser.
A região chamada córtex pré-frontal é uma das principais responsáveis pela autoconsciência e pela tomada de decisões que definem nossa personalidade. O córtex parietal, por outro lado, ajuda a criar um senso de localização no espaço, garantindo que saibamos onde nosso corpo começa e termina. Além disso, o sistema límbico, que inclui a amígdala e o hipocampo, é essencial para associarmos experiências emocionais à nossa identidade, construindo nossa narrativa interna de quem somos.
Tudo isso funciona de maneira automática, sem que precisemos pensar conscientemente sobre nossa existência. No entanto, quando algum desses processos se desequilibra – seja por trauma, estresse intenso ou transtornos psicológicos – podemos começar a nos sentir desconectados de nossa própria identidade. Isso pode explicar por que algumas pessoas têm episódios de despersonalização, nos quais sentem que são apenas um observador de sua própria vida, como se não fossem realmente quem dizem ser.
O Conflito Entre a Autoimagem e a Percepção Interna
Apesar de o cérebro ter mecanismos bem definidos para nos fazer sentir como indivíduos únicos, muitas vezes há um conflito entre a forma como nos vemos por fora e como nos sentimos por dentro. Isso pode acontecer por várias razões:
1. As Expectativas Sociais: Vivemos em um mundo que nos impõe padrões e expectativas. Desde pequenos, aprendemos a nos enxergar através dos olhos dos outros – a forma como as pessoas nos percebem pode afetar profundamente a maneira como nos enxergamos. Às vezes, sentimos que precisamos ser de um jeito específico para sermos aceitos, o que gera um abismo entre a identidade real e a identidade projetada.
2. A Influência das Emoções: Nossa autoimagem pode mudar conforme nosso estado emocional. Em dias bons, olhamos no espelho e sentimos que somos exatamente quem deveríamos ser. Em dias ruins, podemos sentir que estamos presos em um corpo que não nos pertence, como se a imagem refletida não carregasse toda a complexidade do que sentimos.
3. A Memória e a Narrativa Pessoal: Construímos quem somos com base em nossas memórias e experiências. Se um evento traumático nos faz questionar nossa identidade, nossa percepção sobre nós mesmos pode mudar drasticamente. O que antes parecia sólido se torna incerto, criando um sentimento de alienação em relação ao próprio eu.
4. A Diferença Entre Corpo e Mente: Há um contraste constante entre o que pensamos e o que expressamos. Nossa mente pode estar em um lugar completamente diferente do nosso corpo, e isso gera um desajuste na nossa percepção de identidade. Muitas vezes, sentimos que quem somos internamente é muito mais vasto do que aquilo que podemos demonstrar fisicamente.
Esse conflito entre a autoimagem e a percepção interna pode se manifestar em sentimentos de estranheza consigo mesmo, crises de identidade e até em episódios de despersonalização. Mas será que somos apenas um corpo? Ou há algo além da matéria que define nossa existência?
Somos Apenas um Corpo ou Algo Além Disso?
Essa é uma pergunta que atravessa a história da filosofia e da ciência. De um lado, há a visão materialista, que afirma que tudo o que somos é resultado da atividade cerebral – nossos pensamentos, emoções e identidade seriam apenas efeitos da bioquímica do cérebro. Por outro lado, há perspectivas que sugerem que nossa consciência vai além do físico, sendo algo que transcende o corpo e a matéria.
Na psicologia, o conceito de "self" – ou seja, o "eu" – é estudado de diversas maneiras. Para algumas teorias, a identidade é fluida e se transforma constantemente, dependendo das experiências e do ambiente. Já para outras correntes, existe um "núcleo" essencial em cada pessoa, algo imutável que nos acompanha ao longo da vida.
A espiritualidade também oferece visões distintas sobre essa questão. Algumas tradições acreditam que o corpo é apenas um veículo para a alma, e que nossa essência verdadeira não pode ser limitada pela biologia. Outras correntes sugerem que o que chamamos de "eu" é apenas uma ilusão criada pelo cérebro para dar sentido à existência.
Independentemente da resposta, uma coisa é certa: nossa identidade é mais do que apenas uma aparência externa. Ela é composta por memórias, sentimentos, crenças e experiências que nos tornam únicos. A sensação de estranheza em relação ao próprio corpo pode ser um sinal de que estamos buscando entender melhor quem realmente somos – um convite para mergulhar mais fundo na nossa própria existência.
Talvez nunca possamos responder com certeza se somos apenas um corpo ou algo além disso. Mas o que importa é o que escolhemos fazer com essa dúvida. Será que podemos encontrar uma forma de nos reconectar com nossa identidade? Será que podemos aceitar a complexidade de sermos humanos, feitos de carne e osso, mas também de emoções e pensamentos que vão além do que os olhos podem ver?
No fim, a jornada para entender quem somos não é linear – é um caminho cheio de questionamentos, descobertas e mudanças. E talvez essa seja a beleza da existência: nunca sermos totalmente os mesmos, mas sempre estarmos em busca de nos reconhecer.
O Impacto na Vida Cotidiana: Viver Sem Se Sentir Presente
Viver sem se sentir presente é como existir dentro de um vidro fosco: eu vejo o mundo ao meu redor, vejo as pessoas interagindo comigo, sinto o toque, escuto as vozes, mas tudo parece distante, como se houvesse uma barreira invisível entre mim e a realidade. Não é que eu tenha esquecido quem sou – racionalmente, sei exatamente quem sou. Sei meu nome, minha história, os lugares onde estive, as pessoas com quem me importo. Mas, ao mesmo tempo, tudo parece desconectado de mim.
A despersonalização não é apenas um estado de espírito passageiro, um momento de distração ou alienação. É um buraco na identidade, um espaço vazio onde antes havia uma sensação concreta de ser alguém. Isso afeta a forma como interajo com os outros, como experimento emoções e como lido com o simples ato de existir.
Relacionamentos e Emoções: Quando Nada Parece Real
Quando eu não me sinto real, como posso sentir que os outros são? Esse é um dos impactos mais cruéis da despersonalização. As conexões que antes pareciam intensas e significativas agora parecem algo distante, como se eu estivesse assistindo a um filme da minha própria vida. Sei que amo as pessoas à minha volta, mas a sensação de amor parece enfraquecida, como se estivesse separada de mim por uma parede de vidro.
Converso com amigos e familiares, dou risada, faço planos, mas tudo parece meio automático, como se eu estivesse seguindo um roteiro e não vivendo de verdade. O contato físico, algo que sempre foi importante para mim, ainda está ali – eu sinto quando alguém segura minha mão ou me abraça –, mas a sensação emocional que deveria acompanhar isso parece anestesiada. Como se meu corpo estivesse reagindo, mas minha mente não estivesse lá para registrar plenamente o que está acontecendo.
É frustrante, porque eu quero sentir. Quero estar presente, quero me emocionar, quero viver tudo com intensidade. Mas algo me impede. Parece que minha mente se colocou no piloto automático, e por mais que eu tente assumir o controle novamente, tudo continua distante.
O Medo de Nunca Mais Me Sentir "Real"
Talvez o pior de tudo seja o medo. O medo de que isso nunca vá embora. O medo de que eu tenha perdido para sempre a sensação de estar viva.
Nos primeiros momentos em que senti essa desconexão, achei que fosse passageira. Pensei que era só um estado de cansaço, de estresse, e que logo voltaria ao normal. Mas os dias passaram, depois semanas, e a estranheza continuou. Comecei a me perguntar: E se essa for minha nova realidade? E se nunca mais voltar a sentir como antes?
Essa dúvida me consome. Porque ninguém sabe me dar uma resposta definitiva. Eu pesquiso, leio relatos de outras pessoas, tento entender se existe uma saída, mas tudo o que encontro são histórias de pessoas que passaram anos se sentindo assim, sem nenhuma certeza de quando – ou se – vão melhorar.
A incerteza é angustiante. Tento me distrair, tento focar em outras coisas, mas sempre há aquele pensamento de fundo: Isso é para sempre?
A Frustração de Saber Quem Sou, Mas Não Sentir Isso
Se há algo que me incomoda profundamente, é essa contradição: eu sei racionalmente quem sou. Sei minha história, minhas preferências, meus valores. Sei do que gosto e do que não gosto. Mas não sinto isso.
É como se eu estivesse interpretando um papel, uma personagem de mim mesma. Eu continuo fazendo as coisas que sempre fiz, mas há um distanciamento, como se eu estivesse observando tudo de fora, sem realmente participar. Me olho no espelho e reconheço minha aparência, mas não me reconheço. Meu rosto parece uma máscara, um retrato de alguém que deveria ser eu, mas que não me desperta identificação real.
Isso gera uma frustração imensa, porque sei que essa não sou eu de verdade. Eu sempre fui intensa, sempre vivi as emoções com profundidade, sempre me importei com as coisas ao meu redor. Mas agora, tudo parece neutro, como se eu estivesse separada do mundo por uma camada invisível que eu não consigo atravessar.
Às vezes, penso se estou presa em um sonho, se um dia vou simplesmente "acordar" e tudo vai voltar ao normal. Mas o tempo passa, e eu continuo aqui, tentando encontrar uma forma de voltar para mim mesma.
O Impacto na Vida Cotidiana
Essa sensação de desconexão não afeta apenas meu mundo interno – ela se reflete em todas as áreas da minha vida.
Nos estudos, sinto que faço as coisas no automático. Posso estar escrevendo, lendo ou até conversando sobre algo que normalmente me interessaria, mas tudo parece meio distante, como se eu não estivesse realmente ali.
Nas relações sociais, me esforço para parecer presente, para interagir, para dar respostas adequadas. Mas por dentro, sinto que sou apenas uma sombra de mim mesma, fingindo estar 100% ali quando, na verdade, uma parte de mim está vagando em algum lugar inacessível.
Nas emoções do dia a dia, as reações parecem apagadas. Se algo bom acontece, eu sei que deveria estar feliz, mas a felicidade não vem com a mesma força. Se algo ruim acontece, eu sei que deveria estar triste, mas a tristeza não me atinge da forma que costumava. É como se um filtro tivesse sido colocado sobre todas as minhas emoções, deixando tudo em um tom meio pálido, meio sem vida.
O pior é que, por fora, nada disso é visível. As pessoas me veem e acham que está tudo normal, porque eu ainda rio, ainda converso, ainda faço as coisas de sempre. Mas ninguém vê o que acontece dentro de mim.
Como Continuar?
A grande questão agora é: como seguir em frente quando me sinto tão ausente de mim mesma? Como continuar vivendo quando a sensação de "ser eu" se tornou algo tão distante?
Por enquanto, eu não tenho todas as respostas. Estou tentando entender, tentando encontrar formas de me reconectar, tentando sentir algo além desse vazio estranho. Sei que não sou a única a passar por isso, e talvez isso seja um pequeno conforto – saber que há outras pessoas que entendem exatamente essa sensação de estar viva, mas não sentir-se viva.
Eu não quero que essa seja minha realidade para sempre. Quero encontrar um caminho de volta para mim mesma. Quero sentir que sou real de novo. Mas até lá, tudo o que posso fazer é continuar tentando, continuar buscando, e esperar que, em algum momento, essa sensação de estar desconectada finalmente desapareça.
Reconectando-se: Como Voltar a Sentir Que Você é Você
Eu quero voltar. Quero sentir que sou real de novo. Quero olhar no espelho e me reconhecer, sem aquela estranheza silenciosa que me faz questionar se esse rosto é mesmo meu. Quero estar presente na minha própria vida, sentir as emoções fluindo sem esse filtro que parece me manter afastada do mundo. Mas como? Como sair desse estado quando tudo em mim parece preso nesse distanciamento?
Sei que não existe um botão mágico que simplesmente me traga de volta. Sei que não posso forçar minha mente a sentir algo que, por algum motivo, ela decidiu bloquear. Mas também sei que há caminhos. Pequenos passos que podem me ajudar a construir uma ponte entre esse vazio e a sensação de ser eu mesma novamente.
Estratégias Psicológicas para Sair Desse Estado
A despersonalização, apesar de assustadora, não significa que eu estou perdida para sempre. É um estado mental, não uma sentença permanente. Ela acontece porque, de alguma forma, minha mente se desconectou como um mecanismo de defesa – contra o estresse, a ansiedade, o excesso de pensamentos. Mas se minha mente pode se fechar, ela também pode se abrir novamente.
1. Reduzir o excesso de estímulos
Muitas vezes, minha mente fica sobrecarregada. Redes sociais, notícias, responsabilidades, pensamentos acelerados – tudo isso contribui para um estado de hiperatividade mental que só reforça a sensação de distanciamento. Diminuir esse bombardeio de informações pode ser um primeiro passo.
2. Criar uma rotina mais estável
Quando minha mente não sabe o que esperar do dia, ela pode se sentir ainda mais perdida. Estabelecer pequenos hábitos previsíveis – acordar e dormir nos mesmos horários, reservar momentos para atividades tranquilas, cuidar de mim mesma – pode ajudar a criar um senso maior de presença.
3. Falar sobre o que estou sentindo
Guardar isso só para mim faz parecer que estou sozinha, que ninguém pode entender. Mas, ao compartilhar, percebo que há pessoas que já passaram por isso, que sabem exatamente como é essa desconexão. Às vezes, dar nome ao que estou sentindo já é um passo para me sentir mais real.
4. Evitar lutar contra o sentimento
A tentativa desesperada de voltar ao normal pode me colocar em um ciclo de frustração e ansiedade. Quanto mais eu me esforço para sair desse estado, mais reforço a ideia de que algo está errado, de que eu deveria estar diferente. E isso só alimenta a sensação de alienação. Talvez o caminho não seja lutar, mas permitir que isso exista sem deixar que me defina.
O Papel da Atenção Plena e do Aterramento na Reconexão com o Corpo
Se minha mente se afastou da realidade, então talvez eu precise lembrá-la de como é estar presente no mundo físico.
1. Práticas de atenção plena (mindfulness)
Mindfulness não é sobre forçar minha mente a se sentir presente, mas sim sobre observar sem julgamento. Se eu estiver lavando as mãos, posso focar na temperatura da água, na textura do sabão, no cheiro. Se estiver comendo, posso prestar atenção ao gosto, à sensação de mastigar. São pequenos exercícios que me puxam de volta para o momento presente.
2. Exercícios de aterramento
Aterramento é uma forma de lembrar ao meu cérebro que estou aqui, agora. Algumas técnicas incluem:
Respirar fundo e contar cada respiração, sentindo o ar entrando e saindo dos pulmões.
Pressionar os pés no chão e sentir a textura abaixo deles.
Segurar um objeto e descrever mentalmente como ele é. Frio? Quente? Liso? Áspero?
Ouvir sons ao redor e nomeá-los – o barulho de um pássaro, de um carro, do vento.
Esses pequenos exercícios me ancoram no presente. Eles me lembram que não sou apenas um pensamento vagando pelo vazio – sou um corpo, existindo aqui e agora.
3. Movimento e conexão física
Muitas vezes, a despersonalização me faz sentir como se meu corpo não fosse realmente meu. Então, uma forma de me reconectar com ele é me mover de forma intencional. Caminhar descalça pela casa, alongar lentamente, sentir a textura das roupas na pele – tudo isso pode ajudar a reconstruir o elo entre mente e corpo.
Aceitação: Esse Estado Não Define Quem Eu Sou
Talvez a parte mais difícil de tudo isso seja aceitar que essa fase faz parte da minha jornada, mas não é quem eu sou.
Eu não sou a despersonalização. Não sou apenas essa sensação de estar longe de mim mesma. Não sou apenas esse medo de nunca voltar a me sentir real.
Eu sou muito mais do que isso.
Minha mente, por alguma razão, precisou desse mecanismo de defesa. Mas ela não me abandonou. Ela ainda está aqui, tentando encontrar o caminho de volta. Eu só preciso ter paciência comigo mesma, não me julgar tanto, não me cobrar uma recuperação imediata.
E, acima de tudo, preciso lembrar que já existi plenamente antes. Sei o que é sentir, sei o que é estar presente, sei o que é viver intensamente. Isso significa que posso sentir tudo isso de novo.
Aos poucos. No meu tempo. Sem pressa, sem culpa. Apenas me permitindo, passo a passo, voltar a ser eu.
Somos Mais do Que Apenas Um Reflexo
Olhar para o próprio reflexo e não se reconhecer. Viver a própria vida como se estivesse assistindo de fora. Sentir-se uma estranha dentro do próprio corpo.
Sei como é essa sensação, esse vazio silencioso que transforma a existência em algo abstrato. Mas sei também que somos mais do que isso. Mais do que essa distância que parece nos separar de quem realmente somos. Porque, no fim, não somos apenas um reflexo no espelho – somos tudo aquilo que sentimos, tudo o que pensamos, tudo o que vivemos. Mesmo que às vezes isso pareça distante, ainda está lá, em algum lugar dentro de nós.
A despersonalização pode ser assustadora, sim. Pode fazer parecer que nunca mais voltaremos a sentir a vida de verdade. Mas ela não nos define. Não somos apenas esse estado passageiro. E não precisamos enfrentar isso sozinhos.
Falar sobre isso é essencial. Procurar ajuda – seja de amigos, de familiares ou de profissionais – não é um sinal de fraqueza, mas um passo importante para entender e acolher o que está acontecendo dentro de nós. A mente humana é complexa, e nem sempre conseguimos resolver tudo sozinhos. E está tudo bem.
O mais importante é lembrar que isso não é o fim. A sensação de realidade pode parecer distante agora, mas ela não desapareceu para sempre. Ela ainda existe dentro de nós, esperando para ser redescoberta.
E talvez o primeiro passo para essa reconexão seja reconhecer que não estamos sozinhos nessa experiência.
Então eu pergunto: você já se sentiu assim?
Agradeço por lerem o post de hoje. A despersonalização começou a fazer parte da minha vida a alguns meses e eu nunca quis compartilhar com ninguém, mas recentemente compartilhei com um amigo e resolvi escrever sobre isso aqui no substack também. Espero que tenham gostado e até o próximo post!
Com carinho,
Laura Gibson. 🥀